quarta-feira, 2 de abril de 2008

Festivais de cinema em números

Reportagem publicada no sítio PortalLiteral.

Confira os números da primeira pesquisa realizada com 132 festivais de cinema brasileiro, realizados aqui e no exterior. Enquanto estes eventos crescem, diminui o espaço para o filme nacional no circuito comercial

por Bruno Dorigatti para o PortalLiteral

O número de festivais dedicados aos filmes brasileiros cresce a cada ano, os eventos tornam-se cada vez mais descentralizados, o público ultrapassa a casa dos 2 milhões. Logo, poderíamos deduzir uma maior exibição de filmes nacionais nas telas de cinema. Infelizmente, não é isso que vem ocorrendo. No circuito regular, as 2.096 salas de cinema (das quais, apenas 70 são de cinemas de rua; o restante, está em shoppings e nos chamados multiplex) exibiram, em junho de 2007, 92% de filmes norte-americanos, sendo que, desta porcentagem, 70% das salas eram ocupadas por apenas três blockbusters.

Se, ao mesmo tempo, é possível lamentar essa situação nas telonas, vislumbra-se outro território de combate e militância do cinema nacional, para além dos festivais: as novas plataformas de exibição, seja através da recém-criada TV Brasil, ou dos Pontos de Cultura, sem falar no imenso alcance da internet e, sobretudo, da telefonia móvel.

Estas constatações surgiram no debate realizado na última sexta-feira, 7 de março, na 1. Feira Livre - Feira Audiovisual do Rio, como parte da 7. Mostra do Filme Livre, quando foram lançados o estudo inédito Festivais audiovisuais: diagnóstico setorial 2007; indicadores 2006, e a 10. edição do Guia Kinoforum: festivais de cinema e vídeo 2008. Ambos estão disponíveis on-line. Confira os links ao final desta matéria.

Participaram, entre outros, Antonio Leal, coordenador geral do
Fórum dos Festivais e do Diagnóstico setorial, que apresentou um resumo dos principais números da pesquisa (leia abaixo), Zita Carvalhosa, organizadora do Guia Kinoforum 2008, e Sílvio Da-Rin, secretário do Audiovisual.

Da-Rin está há 100 dias no cargo, em substituição a Orlando Senna, que ocupa agora a direção geral da TV Brasil. Diretor do documentário Hércules 56 (2007), sobre 15 prisioneiros políticos trocados pelo Embaixador americano num seqüestro em 1969 por grupos revolucionários, o novo secretário levantou três pontos a respeito do Diagnóstico setorial dos festivais audiovisuais. "Primeiro, gostaria de ressaltar o ineditismo, a criação de uma metodologia, lastreada por iniciativas anteriores, como o Guia dos Festivais que este ano alcançou sua décima edição. Segundo, que isto acontece no ano de um boom, quando tivemos, de 2005 para 2006, um aumento de 37,5% no número de festivais quando estes passaram de 96 para 132. Então tínhamos a necessidade deste mapeamento, e ele veio na hora fundamental. Terceiro, que estamos instituindo uma base de dados não só para consulta, mas também para análise", afirmou Da-Rin.

O secretário lembrou ainda do lançamento do
Observatório dos Editais, que aconteceu um dia antes, 6 de março, e pretende "estruturar e sistematizar as seleções públicas do Ministério da Cultura". Segundo dados do Ministério, desde 2003, a cada ano, o MinC tem aumentado em 75% o uso de seleções públicas em suas políticas de apoio à cultura.

Leal apontou a importância dos eventos como processos, que não acabam quando o finda o festival. "Em Belém do Pará, por exemplo, depois do festival que acontece geralmente no começo de julho ele se torna itinerante pelas ilhas e vai até o outro festival." O processo também pode ser percebido nos Pontos de Cultura, que já passam de 650, e basicamente são projetos de inclusão social e cultural já existentes que recebem apoio do MinC para desenvolver seus projetos, sem tutela, mas com prestação de contas para que continue recebendo esse incentivo. Parte do incentivo recebido pelos Pontos é utilizado para aquisição de equipamento multimídia em software livre composto por microcomputador, miniestúdio para gravar CD, câmera digital e ilha de edição. E agora os Pontos de Cultura começam a se tornar também locais de exibição.

E está aí a saída para o cinema brasileiro alcançar um público maior. É preciso que o fetiche pela telona – onde muitos produzem pensando em serem exibidos no cinema – dê lugar pela busca de novas platéias. Como os Pontos de Cultura, a TV Brasil, que vem ampliando, desde a época que funcionava como TV Educativa, o espaço para o cinema e o documentário brasileiros. Sem falar nas novas tecnologias.

Da-Rin lembrou que o país possui hoje 2.096 salas de cinema. Hollywood cada vez mais faz lançamentos globais de seus blockbusters, às vezes com números exobritantes de 700 cópias por filme, sem falar nos gadgets e subprodutos que invadem o mercado junto com o filme, e a pomposa verba de mídia. "Tela de cinema, hoje, é isso. O acesso se tornou complicado, Em 2007, 80 filmes foram lançados no país, mas isso acaba por pulverizar-se. Somente dois ultrapassaram um público de 2 milhões de telespectadores [Tropa de elite e A grande família], a média foi de 50 mil, 100 mil telespectadores. Em 2003, tínhamos 22% de ocupação das telas. Hoje, este número é de 10%", apontou o secretário, que concluiu: "A aspiração à tela esbarra em obstáculos poderosos. Por outro lado, a tecnologia digital é a opção, com DVD, TV digital, internet, telefonia móvel", indicando um possível caminho da Secretaria do Audiovisual, que contemple essas possibilidades mais democráticas para a exibição da nossa produção.

Números

No Diagnóstico setorial 2007, primeiro estudo sobre o tema, realizado pelo Fórum dos Festivais, foram identificados 132 eventos realizados em 2006, 22 deles em sua primeira edição. Em 1999, eram 38 eventos. Do total de festivais dedicados ao cinema brasileiro, 9 aconteceram no exterior, e 123 no país. O Sudeste do país lidera, com 68 festivais realizados em 2006, seguido pelo Nordeste, com 20, Sul, com 15, Centro-Oeste com 11, e Norte, com 9 festivais. Embora a concentração ainda se dê nas capitais, onde acontecem 78 de todos os 123 realizados em território nacional, o número de eventos realizados no interior do país alcança a marca de 45. Os únicos estados que ainda não têm uma mostra regular de audiovisual em 2006 são Acre e Roraima.

O total de público presente nos festivais audiovisuais realizados em 2006 alcançou a marca de 2.209.559 pessoas, o que dá uma média de 16.739 espectadores por festival. A concentração segue no Sudeste, sobretudo em São Paulo (479.100 espectadores, 21,68% do total), Rio de Janeiro (456.800 espectadores, 20,67%) e Minas Gerais (184.609 espectadores, 8,36%), que somadas chegam a 1.120.509 pessoas, ou 50,71%, mais da metade do púbico total. Mas quem chama a atenção são os estados de Goiás e do Amazonas. O primeiro, com apenas três festivais, atraiu 181 mil espectadores (8,19% do total), e alcançou a melhor média, com 60.333. Já o Amazonas, com quatro festivais, alcançou 156 mil espectadores (7,06% do total), com média de 39 mil por evento.

O total de exibições alcançou o expressivo número de 12.512, sendo que 72,31% destes, ou 9.048, foram de curtas-metragens. Os longas ficaram com 20,58% de participação, com 2.575 exibições, os média-metragens com 6,72%, e 841 exibições, e os seriados representaram 0,39%, com apenas 48 exibições. A respeito dos espaços de exibição, 72,97% dos festivais utilizaram salas existentes em espaços culturais, 52,25% deles adaptaram ou adequaram salas já existentes, 47,75% realizaram projeções ao ar livre, 34,23% ocuparam salas do circuito comercial existente, 23,42% se utilizaram de tendas e lonas, 14,41%, de escolas, e 8,11%, de clubes. Lembrando que o número total ultrapassa os 100%, já que alguns festivais se utilizam de diferentes espaços.

Além de fortalecer e viabilizar a exibição de filmes que dificilmente teriam outro canal para exibição, 71,97% dos festivais realizam seminário, debates ou mesas de discussão a respeito da produção cinematográfica brasileira, 60,61% ministram oficinas, e 43,94% têm como atividade complementar workshops. É dentro deste circuito de festivais que acontecem os encontros do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), da Associação Brasileira de Documentaristas e Curtametragistas (ABD&C), da Associação dos Produtores e Cineastas do Norte e Nordeste (APCNN), do Fórum dos Festivais, do Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro (CPCB) e da Associação Brasileira de Cinema de Animação (ABCA), entre outros.

Outro aspecto que pode ser considerado democratizante é a gratuidade da ampla maioria dos festivais: 84,85% não cobram ingressos, e o restante, 15,15%, cobra, mas mantém sessões gratuitas, como as lonas culturais e exibições na praia, no Festival do Rio.

Os recursos movimentados pelos 132 festivais realizados em 2006, no Brasil e no exterior, envolvendo o cinema brasileiro quase alcançaram a quantia nada desprezível de R$ 60 milhões, valor que engloba a captação em recursos financeiros, parcerias, apoios, bens e serviços. O estado que mais captou foi o Rio de Janeiro, com R$ 13.653.965 (22,77% do total), seguido por São Paulo, com R$ 10.428.125 (17,39%), e os nove festivais no exterior, que totalizaram R$ 6.483.000 (10,81%). A concentração segue no eixo Rio-SP. O Sudeste foi responsável por quase metade dos recursos captados em 2006, com R$ 29.066.240, ou 48,46% do total, seguido de longe pelo Centro-Oeste, com R$ 7.690.000, 12,82% do total.

Destes (quase) R$ 60 milhões, R$ 26.184.236,80 foram captados através da Lei Rouanet (43,66% do total), R$ 7.283.400 vieram do apoio dos governos estaduais (12,14%) e R$ 6.076.926,20 através da obtenção de apoio em Bens e Serviços, ou seja, com parcerias tradicionais dos festivais com empresas do setor de infra-estrutura audiovisual, como Quanta, Labocine, Kodak, Link Digital, TeleImage, Estúdios Mega, Megacolor, Casablanca e Cinerama, além de outras empresas e instituições, como Centro Técnico Audiovisual (CTAv), Cinemateca Brasileira, Ministério das Relações Exteriores, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Agência Nacional do Cinema (Ancine), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ), Sesc, Canal Brasil, Revista do Cinema Brasileiro, Revista de Cinema, Rede Brasil (hoje, TV Brasil), além de companhias aéreas, restaurantes e outras empresas do setor de distribuição, exibição, comunicação, logística e tecnologia.

Os principais patrocinadores foram as grandes empresas estatais, como a Petrobras, Eletrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, Infraero, Banco do Nordeste e Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf). Em dezembro de 2006, a Petrobras lançou o primeiro edital de seleção pública para a escolha de projetos de festivais de cinema, onde foram contemplados 23, dos 87 inscritos. Somando-se aos 15 festivais apoiados como projetos de continuidade, o total de eventos com patrocínio da estatal chegou a 38.

Calendário

Já o Guia Kinoforum: festivais de cinema e vídeo 2008 apresenta, em sua versão impressa, 128 festivais, divididos em "Circuito consolidado", com 55 festivais, "Ampliando o circuito", com 64, e "A conferir", eventos que ainda dependiam ou dependem de recursos e apoio para serem realizados, com 9. O Guia tem atualização on-line, e o número de eventos geralmente cresce no decorrer do ano. Ele traz as principais informações de cada festival, como prazo de inscrições, programação, atividades paralelas, contatos, responsáveis, e os últimos premiados. Além disso, traz informações sobre festivais internacionais, circuitos alternativos de exibição, a produção audiovisual nacional de longas, curtas e médias-metragens de 2006-2007, números do mercado audiovisual brasileiro compilados pela Filme B, mecanismos de fomento (leis de incentivo, editais etc.), cursos de formação superior, escolas audiovisuais e oficinas de inclusão audiovisual, e lista de contatos de distribuidoras e produtoras. Indispensável para quem produz audiovisual no país e deseja ver sua obra circulando.

Confira:

Festivais audiovisuais: diagnóstico setorial 2007; indicadores 2006.

Guia Kinoforum: festivais de cinema e vídeo 2008.
O Guia 2008 entra no ar no dia 15 de março.

Observatório dos Editais.

Fonte: PortalLiteral

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